segunda-feira, 16 de maio de 2011

CAP UM - Sufocando na Segunda-Feira!


PRÓXIMA PARADA: INSANIDADE

Felícia não era nada feliz, pelo contrário, sempre se perguntou o motivo de ter um nome tão absurdamente irônico. Felícia do Santíssimo Japeri... Enfim, era uma mulher de trinta e muitos anos, o corpo, ou falta de corpo, era pequeno e muito, muito magro. Para disfarçar sua mínima estatura, usava saltos exagerados. Para disfarçar sua magreza, usava listras horizontais. Dicas de beleza que anotava periodicamente de programas femininos e revistas para mulheres com estima abaixo de zero.

O dia não era muito favorável, uma segunda. Sempre se perguntou que tipo de maldição ou evento macabro foi realizado numa segunda, pois esta era a única explicação razoável para este ser um dia tão detestável. O fato é que não existia um dia pior para iniciar um novo emprego, isto sem contar o fato de estar de TPM... Típico.

Cotidiano. Sim, Cotidiano era a música que usava como alarme de seu telefone, era com a voz de Chico Buarque que nossa trágica heroína acordava, irritada, todos os dias. Cabelos de Medusa, olhos vermelhos, pijama da Hello Kitty, mesmo assim não entendia o motivo de ainda estar solteira. Odiando Chico Buarque, levantou. Nem se deu ao trabalho de olhar no espelho, já estava estressada o suficiente. Foi para o banho, lamentando ainda ser... Segunda-Feira...

Quarenta e seis minutos foi o tempo exato que se demorou para arrumar os cabelos, secos, grossos e rebeldes. Fez um rabo de cavalo, era prático e ponto. Sentiu que definitivamente não era o seu dia ao ver uma chuva, sacana e pesada, cair. "Que ótimo", pensou ao fzer gestos obcenos para seu reflexo no vidro da janela. Voltou, vestiu seu melhor casaco, pegou um guarda-chuva e trocou o par de sapatos brancos, seus preferidos.

Precisou correr para pegar o trem, já que se perdesse aquele, chegaria atrasada, correndo o risco de perder seu grandioso emprego de acessorista de elevador. O elevador da vida de Felícia parecia estar sempre no térreo.

Como era de esperar, o primeiro vagão estava cheio, cheio é bondade, estava lotado, tão lotado que as pessoas pareciam íntimas. Pegar um vagão lotado é quase uma experiência sobrenatural, porque você se roça tanto nas demais pessoas, que quando você deixa aquele ambiente populoso leva consigo um pedaço de cada um dos outros seres apertados. A pessoa entra com um perfume e sai com outro completamente diferente, ótima oportunidade para conhecer novas fragrâncias.

A porta se fechou.

Não se surpreendeu quando, na estação seguinte, subiram mais sete pessoas. Aquilo era desesperador. Queria gritar, mas não tinha ar suficiente. O calor humano era tanto que Felícia estava assando e já não gostava tanto daquele casaco. Passou a odiar profundamente o casaco, queria arrancar, jogar pela janela, isto é, se o trem tivesse janelas! Sabe trem de ar-condicionado fantasma? Aquele que você sabe que existe, mas que nunca presenciou o fenômeno? Era esse!

Ainda não estava na metade do caminho e, a cada estação, mais e mais pessoas surgiam.

Na quinta estação pensou em suicídio. Na sexta desejou ser milionária e tacar ovos nas pessoas que não usavam desodorante. Imprensada na sétima. Esmagada na oitava. Na nona sentiu alguém lhe apertar as nádegas, chegou a sorrir saliente, no entanto se deu conta que fora sua própria mão num ato involuntário.

Vinte e quatro estações, vinte e quatro motivos para berrar, contudo não podia negar a felicidade, quase um orgasmo, que sentiu ao colocar os pés para fora. Descabelada, molhada de suor e chuva... O dia só estava começando... Ainda era Segunda-feira...

Que venha o metrô...

Continua na terça...

Um comentário:

  1. Sem palavras para seu texto. Você escreve com tanta facilidade. Pobre Felícia e seu nome irônico. Conheço Felícias da vida kkkk A.D.O.R.E.I!!

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