ALICE NO FUNDO DO POÇO
EPISÓDIO DE HOJE:
FELIZ ANIVERSÁRIO
— Francamente, preciso ser mais
rigoroso na contratação dos funcionários... Alice! — Salgado não era muito mais
velho que Alice. A barba por fazer, os cabelos loiros com alguns fios brancos
lhe dava certo charme. O fato é que só estava naquela posição por ser filho do
patrão, o Salgado Pai. Sabe aquele sujeito que todas flertam a primeira vista,
porém depois de conhecer querem distância? Então, era ele!
—
Oi? — Respondeu a Bela Adormecida. Esfregou os olhos, deixando borrar sua
maquiagem. Arrumou rapidamente os papéis de sua mesa, e apagou o
“sdfalçdsfklfkf~ldsafffffffff...” que havia escrito involuntariamente ao dormir
com a cara no teclado do computador.
—
Explique!
—
Salgado! Nossa... Acabei adormecendo...
—
Com a cara no teclado?
—
Anomalia de família. Só consigo dormir assim. Meus pais só dormiam de ponta
cabeça, uma loucura! Vovó só pega no sono se alguém lamber seu pé em movimentos
lentos e circulares
—
Minha nossa! Esqueci o que vim fazer aqui...
—
Salgado, Salgadinho, precisa se tratar. Vive esquecendo as coisas, amigo. Outro
dia veio trabalhar de gravata e sem camisa... Parecia um gogo boy com baixo
orçamento.
—
Hoje é terça ou quarta-feira?
—
Sexta-feira...
— Treze!
—
Sim?
— Feliz aniversário!
Que lindo, não lembra o nome completo, mas se recordou do meu aniversário, pensou Alice.
Que lindo, não lembra o nome completo, mas se recordou do meu aniversário, pensou Alice.
No rádio, uma mulher de voz
irritantemente aguda, anunciava o horóscopo. Tinha certeza que seria um dia
péssimo. Seus aniversários não eram felizes, o mais alegre foi no hospital,
braços e pernas quebrados, tinham lhe empurrado do brinquedo mais alto do
playground, mas pelo menos tinha comida e pessoas lhe dando atenção.
As últimas palavras da radialista
com voz de pata fizeram os pelos da nuca de Alice arrepiar. Ela terminava
assim: “Tudo pode melhorar em sua vida, se você completar a sua missão. Ainda
hoje você receberá um sinal que será...”. Jamais saberia o sinal, pois Salgado
desligou o rádio da tomada, e a olhava como um leão faminto frente a uma lebre
suculenta.
— Tenho um presente. Vai escrever
sua primeira matéria de capa! Uma entrevista com algum artista decadente!
—
Não brinca! Quem?
Na mesma hora sentiu um foco de luz
iluminar seu corpo e o som de palmas, muitas palmas. Já conseguia se imaginar
subindo por uma escada dourada, usando um vestido maravilhoso que deixaria
todas as mulheres e gays se cortando de inveja. Receberia um prêmio e por culpa
disso apresentaria um programa de televisão. Mães batizariam suas filhas com
seu nome, teria sua própria linha de brinquedos e...
— Alice? — berrou o chefe, e
estragou toda a fantasia.
O entusiasmo de nossa querida Alice
Maravilha é porque realizaria o maior sonho de sua vida. Foi escalada para
entrevistar um dos ex-integrantes da Flop4, isto é, se continuasse viva até lá.
Dez anos se passaram desde que a banda acabou e agora ela poderia rever os
olhos azuis do rapaz com quem se imaginava casada, morando numa casa de frente
para o mar, com três filhos loirinhos, falando inglês e criando um casal de
poodle. Ele era lindo, ele era forte, ele era o sonho de consumo de todas as
garotinhas abobalhadas do mundo. Ele era “O Gato”!
CONTINUA
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